terça-feira, 9 de setembro de 2008

“A balada do cárcere de reading”

Contam que Oscar Wilde, certa vez, foi preso. E preso, ele escreveu um dos seus mais belos poemas... Uma tentativa de entender o porque dos homens serem sempre os seus próprios carrascos.

Estes são alguns versos de “A balada do cárcere de reading”:

...A gente destrói aquilo que mais ama
em campo aberto, ou numa emboscada;
alguns com a leveza do carinho
outros com a dureza da palavra;
os covardes destroem com um beijo
os valentes destroem com a espada.
Mas a gente sempre destrói aquilo que mais ama...

...Apesar disso - escutem bem - todos os homens
Matam a coisa amada;
Com galanteio alguns o fazem, enquanto outros
Com face amargurada;
Os covardes o fazem com um beijo,
Os bravos, com a espada!

Um assassina o seu amor na juventude,
Outro, quando ancião;
Com as mãos da Luxúria este estrangula, aquele
Empresta do Ouro a mão;
Os mais gentis usam a faca, porque frios
Os mortos logo estão.

Este ama pouco tempo,
aquele ama demais;
Há comprar, e há vender;
Uns fazem o ato em pranto, enquanto que um suspiro
Outros não dão sequer.
Todo homem mata a coisa amada! - Nem por isso
Todo homem vai morrer...

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Receita para lavar roupa suja

Receita para lavar roupa suja
Viviane Mosé

Mergulhar a palavra suja em água sanitária depois de dois dias de molho, quarar ao sol do meio dia. Algumas palavras quando alvejadas ao sol adquirem consistência de certeza.
Por exemplo a palavra vida.
Existem outras, e a palavra amor é uma delas, que são muito encardidas pelo uso, o que recomenda aguar e bater insistentemente na pedra, depois enxaguar em água corrente.

São poucas as que resistem a esses cuidados, mas existem aquelas.
Dizem que limão e sal tiram sujeira difícil, mas nada. Toda tentativa de lavar piedade foi sempre em vão.

Agora nunca vi palavra tão suja como perda.
Perda e morte na medida que são alvejadas soltam um líquido corrosivo, que atende pelo nome de argura, que é capaz de esvaziar o vigor da língua.
O aconselhado nesse caso é mantê-la sempre de molho em um amaciante de boa qualidade. Agora, se o que você quer é somente aliviar as palavras do uso diário, pode usar simplesmente sabão em pó e máquina de lavar.
O perigo neste caso é misturar palavras que mancham no contato umas com as outras. Culpa, por exemplo, a culpa mancha tudo que encontra e deve ser sempre alvejada sozinha. Outra mistura pouco aconselhada é amizade e desejo, já que desejo, sendo uma palavra intensa, quase agressiva, pode, o que não é inevitável, esgarçar a força delicada da palavra amizade.

Já a palavra força cai bem em qualquer mistura. Outro cuidado importante é não lavar demais as palavras sob o risco de perderem o sentido. A sujeirinha cotidiana quando não é excessiva, produz uma oleosidade que dá vigor aos sons.
Muito importante na arte de lavar palavras é saber reconhecer uma palavra limpa.
Conviva com a palavra durante alguns dias. Deixe que se misture em seus gestos, que passeie pela expressão dos seus sentidos. À noite, permita que se deite, não a seu lado mas sobre seu corpo. Enquanto você dorme, a palavra, plantada em sua carne, prolifera em toda sua possibilidade.

Se puder suportar essa convivência até não mais perceber a presença dela, então você tem uma palavra limpa.

Uma palavra limpa é uma palavra possível.